
ATUALIZAÇÕES DA EDIÇÃO 2024
(DESTACADAS)
RESOLUÇÃO CNPCP Nº 33, DE 21 DE FEVEREIRO DE 2024
Estabelece como Diretriz de Política Penitenciária o fortalecimento da participação da sociedade civil na Execução Penal através de instalação de Canil e Gatil no âmbito dos estabelecimentos penais.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA (CNPCP), no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO o art. 64, incisos I e II da Lei nº 7210/84, que estabelece a atribuição legal do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária para propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas de segurança e contribuir na elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, sugerindo as metas e prioridades da política criminal e penitenciária;
CONSIDERANDO as constantes discussões acerca dos direitos dos animais e sua efetividade diante do teor da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, da qual o Brasil é signatário;
CONSIDERANDO a adoção de política pública de proteção e cuidado para com os animais domésticos em estado de abandono, como um meio de ressocialização e construção social dos indivíduos privados de liberdade;
CONSIDERANDO que a referida política pública compreende a responsabilidade no cumprimento da lei federal nº 9.605/98 (leis dos crimes ambientais), do art 225, §1°, inciso VII da CR/88, bem como os fundamentos da Lei Federal nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), que dentre inúmeras finalidades, tem como escopo maior promover a ressocialização do indivíduo em cumprimento da pena corpórea;
CONSIDERANDO o disposto na Lei nº 14.228, de 20 de outubro de 2021, da proibição de eliminação de cães e gatos pelos órgãos de controle de zoonoses, canis públicos e estabelecimentos oficiais congêneres, salvo animais com males, doenças graves ou enfermidades infectocontagiosas incuráveis que coloquem em risco a saúde humana ou de outros animais;
CONSIDERANDO que a Lei de Execução Penal alvitra em seu primeiro artigo como objetivo da pena, a efetivação das disposições de sentença ou decisão criminal, bem como proporcionar condições para a harmônica integração social;
CONSIDERADO que o art. 4° do mesmo diploma legal preceitua que o Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança;
CONSIDERANDO que a Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal) no caput do art. 28 considera o trabalho do condenado um dever social, condição de dignidade humana, de finalidade educativa e produtiva;
CONSIDERANDO que a Lei de Execução Penal no caput do art. 32. dispõe que na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado;
CONSIDERANDO ainda, que a despeito do disposto na Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), relativamente ao Trabalho Interno, a efetividade das ações ainda é precária em função, principalmente, da carência de oportunidades de trabalho, possibilitando a remissão da pena;
CONSIDERANDO que existem cão-guia que acompanha pessoa com deficiência visual, cães- ouvintes, que alertam pessoas com deficiência auditiva sobre sinais sonoros e cães de serviço, treinados para auxiliar indivíduos com alguma outra deficiência que não visual ou auditiva, como deficiência mental, ou problemas de saúde como epilepsia, diabetes, depressão ou transtorno generalizado de ansiedade;
CONSIDERANDO que as instalações do canil e gatil do na Penitenciária de Tremembé 1 e no Centro de Detenção Provisória de Taubaté respectivamente, se consolidaram como importantes ferramentas de ressocialização dos indivíduos privados de liberdade, de humanização do sistema de execução penal, de desenvolvimento da afetividade, bem como dos aspectos sociais, morais e éticos, de forma a contribuir para a construção da paz social, proporcionando, com excelência, atividades que contemplam o que é preconizado na Lei Federal nº 7.210/84;
CONSIDERANDO que o canil e gatil tem por diretriz a proteção dos animais de companhia, resgatados das ruas ou retirados de maus tratos, bem como, consolidar uma importante ferramenta de ressocialização dos indivíduos privados de liberdade, de humanização do sistema de execução penal, de desenvolvimento da afetividade, bem como dos aspectos sociais, morais e éticos;
CONSIDERANDO a necessidade de uniformização/padronização da instalação de canil e gatil no âmbito dos estabelecimentos penais em âmbito nacional, bem como a necessidade de disciplinar o seu funcionamento; resolve:
Art. 1° Estabelecer como Diretriz de Política Penitenciária o fortalecimento da participação e interlocução da sociedade civil e organizações não governamentais com o poder público para fins de cooperação para instalação de canil e gatil no âmbito dos estabelecimentos penais.
§ 1o. A implementação de canil ou gatil no espaço penitenciário tempo por objetivo geral a ressocialização das pessoas privadas de liberdade e os egressos do sistema prisional, mediante a oferta de trabalho sob o regime estabelecido na Lei de Execução Penal.
§ 2o. Consideram-se os objetivos específicos:
I - qualificar as pessoas para reinserção no mercado de trabalho como portador de certificado de curso técnico, possibilitando a sua contratação por empresas de diversos ramos;
II - preparar as pessoas para reinserção no mercado de trabalho por meio do empreendedorismo autônomo;
III - possibilitar o retorno a sociedade das pessoas privadas de liberdade e egressos, com qualificação profissional; e
IV - proporcionar a empregabilidade dos reclusos na perspectiva de se evitar a reincidência criminal;
Art. 2° O programa para instalação de canil ou gatil poderá ser implementado por meio de Acordo de Cooperação Técnica (ACT) celebrado entre o poder executivo, judiciário e, previamente cadastradas nas secretarias de administração prisional, as prefeituras municipais.
Art. 3o Poderá ser estabelecida rede local de atuação conjunta entre o juízo da execução e demais órgãos envolvidos, tais como, o conselho da comunidade, o centro de zoonoses, o poder executivo estadual ou municipal e as ONGs.
Art. 4° O diretor da unidade, de acordo com a área do estabelecimento penal, definirá qual tamanho adequado para implantação do canil e do gatil.
Art. 5° O canil e o gatil, poderão ser instalados no perímetro dos estabelecimentos penais intramuros ou extramuros.
Art. 6°. Antes de serem inseridos no âmbito interno prisional, os animais deverão vacinados, vermifugados e castrados pelo Centro de Controle de Zoonoses ou, na sua ausência ou impossibilidade, outro órgão estadual ou da prefeitura municipal.
Art. 7°. O trabalho da pessoa privada do direito de liberdade constitui dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva e deverá estar em conformidade com a Lei nº 7.210/84.
Art. 8° Os cães e os gatos serão cuidados por pessoas privadas do direito de liberdade.
§ 1o Será conferida a remição pelo trabalho conforme a Lei de Execução Penal.
§ 2o O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.
§ 3o Deverá haver remuneração da pessoa privada do direito de liberdade e seguirá as regras estabelecidas no art. 29, sob o regime de trabalho definido nos arts. 32, 33 e 34, todos da Lei nº 7.210/84.
§ 4o É vedada a participação de trabalho em canil ou gatil de pessoa privada de liberdade condenada pelo art. 32, e seus respectivos parágrafos, da Lei nº 9.605/98.
Art. 9° As secretarias de administração penitenciária poderão firmar convênios com as faculdades e escolas técnicas em veterinárias para promoção de cursos técnicos a pessoas privadas de liberdade.
Parágrafo único. Deverá ser observada as regras de remição do art. 126 da Lei nº 7.210/84, por ocasião da frequência do interno no curso profissionalizante ou superior.
Art. 10 O cão poderá ser treinado para ser animal de assistência, cão-guia, cão-ouvinte ou cão de serviço.
Art. 11 A Secretaria Nacional de Políticas Penais e as Secretarias de Administrações Penitenciárias das Unidades Federativas poderão, mediante análise de conveniência e oportunidade, disponibilizar recursos próprios ou provenientes de cooperação para a implantação e manutenção dos serviços objetos da presente Resolução.
Art. 12 Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.
RESOLUÇÃO CONJUNTA CNPCP/CNLGBTQIA+ Nº 2, DE 26 MARÇO DE 2024
Estabelece parâmetros para o acolhimento de pessoas LGBTQIA+ em privação de liberdade no Brasil.
A Presidência do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no uso das atribuições legais que lhe conferem o art. 64, I, da Lei nº 7.210/84 e o art. 69 do Decreto nº 11.348, de 1º de janeiro de 2023, e a A Presidência do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Queer, Intersexo, Assexuais e outras - CNLGBTQIA+, no uso das atribuições que lhe confere o Decreto nº 11.471, de 6 de abril de 2023, e
CONSIDERANDO o artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, que estabelece a dignidade humana como fundamento da República Federativa do Brasil;
CONSIDERANDO o art. 3º, incisos I e IV, da Constituição Federal de 1988, que estabelece como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação;
CONSIDERANDO os direitos fundamentais previstos no art. 5º, incisos III, XLI, XLVI, XLVII, XLVIII e XLIX da Constituição Federal de 1988;
CONSIDERANDO o art. 5º, LXXVIII, §§ 2º e 3º, da Constituição Federal de 1988, que versam sobre a internalização de tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico interno e sua observância obrigatória;
CONSIDERANDO os princípios de direitos humanos consagrados em documentos e tratados internacionais, em especial a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966), o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), o Protocolo de São Salvador (1988), a Declaração da Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata (Durban, 2001), as Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras (Bangkok, 2010), as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento dos Reclusos conhecidas como Regras de Nelson Mandela (2015) e as Regras Mínimas Padrão das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade (Tóquio, 1990);
CONSIDERANDO os princípios de Yogyakarta e sua reedição sobre a Aplicação da Legislação Internacional de Direitos Humanos em relação à Orientação Sexual e Identidade de Gênero (Yogyakarta, 2006; 2017);
CONSIDERANDO o que consta da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), incorporada ao ordenamento jurídico por força do Decreto 678, de 6 de novembro de 1992;
CONSIDERANDO o teor do Parecer Consultivo nº 24/17, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que versou sobre uma consulta da Costa Rica sobre identidade de gênero, igualdade e a não discriminação de casais do mesmo gênero, de observância obrigatória pelo Brasil por força do Decreto 4.463/2002, que expressamente asseverou que a orientação sexual, a identidade de gênero e a expressão de gênero são categorias protegidas pelo artigo
1.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos estando, portanto, vedada qualquer norma, ato ou prática discriminatória baseada na orientação sexual ou na identidade de gênero das pessoas (item 68) e que, ainda, a Corte Interamericana asseverou que dentre os fatores que definem a identidade sexual e de gênero de uma pessoa se apresenta como prioridade o fator subjetivo (autopercepção) sobre o fator objetivo (caracteres físicos ou morfológicos);
CONSIDERANDO a Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de 28 de novembro de 2018, em suas Medidas Provisórias decretadas no caso do Complexo Penitenciário do Curado, que ordenou ao Estado brasileiro que adote, em caráter de urgência, as medidas necessárias para garantir a efetiva proteção das pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade;
CONSIDERANDO o disposto na Lei Federal nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal -, em especial nos artigos 5º, 40, 41 e 45, que versam sobre a individualização da execução penal, o respeito à integridade física e moral das pessoas privadas de liberdade, os direitos da pessoa presa e sobre a racionalidade da aplicação de sanções disciplinares no sistema prisional brasileiro;
CONSIDERANDO o Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento de gênero de mulheres transexuais, travestis e homens trans no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional;
CONSIDERANDO o teor da Resolução nº 348, do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece diretrizes e procedimentos a serem observados pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti e intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitoradas eletronicamente;
CONSIDERANDO que o art. 2º da Resolução nº 348 do Conselho Nacional de Justiça estabelece que a resolução tem por objetivo a garantia do direito à vida e à integridade física e mental da população LGBTQIA+, assim como à sua integridade sexual, segurança do corpo, liberdade de expressão da identidade de gênero e orientação afetiva, emocional e/ou sexual, o reconhecimento do direito à autodeterminação de gênero e sexualidade da população LGBTQIA+ e a garantia, sem discriminação, de estudo, trabalho e demais direitos previstos em instrumentos legais e convencionais concernentes à população privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitoração eletrônica em geral, bem como a garantia de direitos específicos da população LGBTQIA+ nessas condições;
CONSIDERANDO o disposto na Resolução Conjunta nº 1, de 15 de abril 2014, do Conselho Nacional de Combate à Discriminação- CNCD/LGBT e do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária-CNPCP/MJ, publicada no DOU de 17/4/2014;
CONSIDERANDO o teor da Nota Técnica nº 9/2020/DIAMGE/CGCAP/DIRPP/ DEPEN, que trata dos procedimentos quanto à custódia de pessoas LGBTI no sistema prisional brasileiro, atendendo aos regramentos internacionais e nacionais, publicada no DOU de 3/4/2020;
CONSIDERANDO as decisões do Supremo Tribunal Federal-STF, com força vinculante para os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal, proferidas:
- na Ação Direta de Inconstitucionalidade-ADI 4.277-DF, Relator Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, DJE de 14/10/2011, segundo a qual o STF assentou a proibição da discriminação das pessoas em razão do gênero, bem como da orientação afetiva, emocional e/ou sexual;
- na Ação Direta de Inconstitucionalidade-ADI 4275, Relator p/ Acórdão Ministro Edson Fachin, Tribunal Pleno, DJe de 7/3/2019, na qual o STF decidiu que o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero, manifestação da própria personalidade da pessoa humana;
- na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão-ADO 26, na qual o STF declarou a omissão do Estado brasileiro em proteger as pessoas LGBTQIA+, concluindo pela subsunção das condutas homotransfóbicas aos diversos preceitos primários de incriminação definidos em legislação penal já existente, a saber, a Lei 7.716/89 - Lei do Racismo -, até que sobrevenha legislação autônoma editada pelo Congresso Nacional;
CONSIDERANDO a necessidade de garantir nas unidades prisionais a dignidade e a segurança das pessoas LGBTQIA+, pois é necessário considerar não apenas a intersexualidade, a identidade de gênero e a orientação afetiva, emocional e/ou sexual, mas também sua segurança social, psíquica e corporal; resolve:
Art. 1º Estabelecer os parâmetros de acolhimento das pessoas LGBTQIA + em privação de liberdade no Brasil.
Da custódia
Art. 2º O reconhecimento da pessoa como parte da população LGBTQIA+ será feito exclusivamente por meio de autodeclaração, que deverá ser colhida pelo(a) magistrado(a) em audiência, em qualquer fase do procedimento penal, incluindo a audiência de custódia, até a extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena, garantidos os direitos à privacidade e à
integridade da pessoa declarante. Nos casos em que o(a) magistrado(a), por qualquer meio, for informado(a) de que a pessoa em juízo pertence à população LGBTQIA+, deverá cientificá- la acerca da possibilidade da autodeclaração e informá-la, em linguagem acessível, os direitos e garantias que lhe assistem.
Parágrafo único. A informação autodeclarada poderá ser armazenada em caráter restrito, ou mesmo ser mantida sigilosa.
Art. 3º O local de privação de liberdade será definido pelo(a) magistrado(a) em decisão fundamentada após questionamento da preferência da pessoa presa, que poderá ocorrer em qualquer momento do processo penal ou da execução da pena, assegurada, ainda, a possibilidade de alteração. A preferência de local de detenção declarada pela pessoa constará expressamente da decisão ou sentença judicial que define o local de privação de liberdade.
Parágrafo único. O direito à escolha da unidade deverá ser assegurado especificamente às pessoas autodeclaradas mulheres e homens transexuais, travestis, pessoas transmasculinas e pessoas não-binárias.
Art. 4º A alocação da pessoa autodeclarada parte da população LGBTQIA+ em estabelecimento prisional, determinada pela autoridade judicial após escuta à pessoa interessada, não poderá resultar na perda de quaisquer direitos relacionados à execução penal em relação às demais pessoas custodiadas no mesmo estabelecimento, especialmente quanto ao acesso ao trabalho, à educação, atenção à saúde, alimentação, assistência material, social, religiosa, condições de cela, banho de sol, visitação e outras rotinas existentes na unidade.
Art. 5º O(a) magistrado(a) deverá explicar, em linguagem acessível, a estrutura dos estabelecimentos prisionais disponíveis na respectiva localidade, da localização de unidades masculina e feminina, da existência de alas ou celas específicas para a população LGBTQIA+, bem como dos reflexos dessa escolha na convivência e no exercício de direitos.
Art. 6º Unidades, alas ou celas específicas para as pessoas LGBTQIA+ em privação de liberdade não devem se destinar à aplicação de medida disciplinar ou de qualquer método coercitivo para outras pessoas privadas de liberdade, bem como não devem se destinar à segregação de pessoas acusadas de crimes contra a dignidade sexual.
§1º Em hipóteses excepcionais, tais como superlotação nos espaços destinados a pessoas LGBTQIA+ ou risco pessoal a estas pessoas provocado por motins, rebeliões ou outras situações semelhantes, poderão estas pessoas ser alocadas em espaços (unidades, alas ou celas) que não lhe são destinadas especificamente, desde que resguardadas sua integridade física e direitos estabelecidos, após decisão fundamentada e aprovada pelo(a) gestor(a) da unidade prisional, desde que em caráter temporário não superior a 30 (trinta) dias, até encaminhá-las para o devido acolhimento, nos termos preconizados nesta resolução.
§2º A Administração Penitenciária deverá comunicar o juízo responsável acerca da excepcionalidade da medida prevista no §1º em até 24 (vinte e quatro) horas para homologação.
§3º O prazo estabelecido no §1º pode ser prorrogado mediante decisão judicial fundamentada.
§4º Após o decurso do prazo estabelecido no §1°, quando da apreciação da prorrogação do período, o magistrado deverá avaliar a possibilidade de aplicar a monitoração eletrônica às pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade que se encontrarem em risco efetivo.
Art. 7º As pessoas intersexo serão encaminhadas à unidade feminina caso se identifiquem com o gênero feminino ou à unidade masculina, caso se identifiquem com o gênero masculino, podendo optar, na unidade que escolherem, pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas.
Art. 8º Caberá ao(à) magistrado(a) indagar à pessoa autodeclarada parte da população gay, lésbica, bissexual, assexual ou pansexual acerca da preferência pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas. Nestes casos não haverá escolha em relação à unidade prisional, mas apenas em relação a alas ou celas específicas, devendo a pessoa ser alocada em unidade masculina ou feminina, conforme sua identidade de gênero.
§1º O homem cisgênero gay deverá ser encaminhado para unidade masculina, pois se identifica com o gênero masculino, podendo optar pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas;
§2º A mulher cisgênero lésbica deverá ser encaminhada para unidade feminina, pois se identifica com o gênero feminino, podendo optar pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas;
§3º As pessoas cisgênero bissexuais, assexuais ou pansexuais serão encaminhadas à unidade feminina caso se identifiquem com o gênero feminino ou à unidade masculina, caso se identifiquem com o gênero masculino, podendo optar, na unidade que escolherem, pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas.
Art. 9º Em relação às pessoas transexuais, travestis, transmasculinas e não-binárias, para garantir os direitos à integridade sexual, à segurança do corpo, à liberdade de expressão da identidade de gênero e ao reconhecimento do direito à autodeterminação de gênero, cabe ao(à) magistrado(a) indagar à pessoa assim autodeclarada acerca da preferência pela custódia em unidade feminina ou masculina ou específica, onde houver, e na unidade escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas, inclusive em ala específica para pessoas transgênero, onde houver.
§1º Travestis e mulheres transexuais devem ser orientadas sobre todos os riscos que envolvem a tomada da decisão, e será facultada a escolha da unidade, feminina ou masculina, que ficará a cargo da própria pessoa.
§2º Homens transexuais e pessoas transmasculinas devem ser orientados sobre todos os riscos que envolvem a tomada da decisão, e será facultada a escolha da unidade, feminina ou masculina, que ficará a cargo da própria pessoa. Na hipótese de escolha por unidade masculina, o alerta sobre os riscos deverá conter a informação de que podem não haver policiais penais femininas lotadas no local.
§3º Pessoas trans autodeclaradas não-binárias e que não se identificam nem com o gênero masculino, nem com o feminino, devem ser orientadas sobre todos os riscos que envolvem a tomada da decisão, devendo ser observados os seguintes critérios:
I - da forma com que a pessoa escolheu construir/performar publicamente sua identidade, considerando sua expressão de gênero; e
II - da forma com que a pessoa construiu sua autoimagem na forma de se apresentar publicamente.
§4º É recomendável que pessoas trans autodeclaradas não-binárias que foram designadas homens ao nascer (AMAB) e que por escolha própria mantêm características alinhadas ao gênero masculino, sejam encaminhadas ao espaço destinado a este gênero, assim como aquelas designadas mulheres ao nascer (AFAB) e que mantenham, por escolha própria, características alinhadas ao gênero feminino, sejam encaminhadas ao espaço destinado a este gênero.
Art. 10. O(a) gestor(a) prisional ou responsável pela inclusão na unidade deve alocar a pessoa LGBTQIA+ em conformidade com a decisão judicial que determinou a prisão, independentemente de retificação de documentos ou da realização ou não de cirurgia de redesignação sexual.
Parágrafo único. Havendo omissão na decisão judicial de encaminhamento ao sistema prisional sobre a autodeclaração de pessoa LGBTQIA+ ou, ainda, divergência entre o que fora decidido e o que é informado na entrada na unidade, deverá o(a) gestor(a) da unidade alocar a pessoa em local que preserve sua segurança e imediatamente informar o Juízo da Execução, para a correspondente deliberação.
Art. 11. Deve ser viabilizada a criação e/ou a implementação de estabelecimentos penais específicos, alas ou celas de convívio LGBTQIA+ nas unidades penitenciárias femininas ou masculinas para promover a segurança e a integridade das pessoas transexuais, travestis, transmasculinas e não-binárias, em razão da especificidade da sua identidade de gênero.
Parágrafo único: A criação de qualquer espaço específico de privação de liberdade destinado à pessoas LGBTQIA+ deve atentar para a descentralização geográfica necessária com vistas à permanência da pessoa presa em local mais próximo possível ao seu meio social e familiar.
Da autodeclaração de pessoa LGBTQIA+ na hipótese de suspeita de falsidade
Art. 12. Na hipótese de fundada suspeita de falsidade na autodeclaração de pessoa LGBTQIA+, deverá ser instaurado procedimento apuratório pelo Juízo da Execução Penal, com jurisdição sobre a unidade prisional, garantido o contraditório e a ampla defesa à pessoa declarante.
§ 1º Considera-se falsa a autodeclaração da pessoa privada de liberdade que não corresponda à sua vivência, experiências e/ou reconhecimento social como pessoa LGBTQIA+, para alcançar finalidade diversa de garantia dos direitos à integridade sexual, à segurança do corpo, à liberdade de expressão de gênero e ao reconhecimento do direito à autodeterminação de gênero e de orientação afetiva, emocional e/ou sexual.
§2º O indício de falsidade da autodeclaração poderá ser reportado à diretoria da unidade prisional por qualquer pessoa em cumprimento de pena na unidade, qualquer servidor(a) lotado(a) na unidade ou por qualquer meio que possa ser considerado suficiente para instaurar procedimento apuratório.
§ 3º A diretoria deverá informar ao Juízo da Execução Penal com jurisdição sobre a unidade acerca da suspeita de falsidade no prazo máximo de 48 (quarenta e oito horas) a partir da ciência - formal ou informal - da situação.
§ 4º Sobre a situação apurada, devem ser juntados ao processo de execução penal da pessoa privada de liberdade:
a) parecer de profissional do serviço de psicologia do sistema prisional, observados os parâmetros das Resoluções do Conselho Federal de Psicologia nº 1, de 22 de março de 1999; Resolução nº 1, de 29 de janeiro de 2018 e Resolução nº 8, de 17 de maio de 2022;
b) parecer de profissional do serviço social do sistema prisional, observados os parâmetros das Resoluções do Conselho Federal de Serviço Social nº 845, de 26 de fevereiro de 2018 e nº Resolução nº 615, de 8 de setembro de 2011, e
c) parecer de comissão formada por três pessoas indicadas por entidades reconhecidamente idôneas de defesa de direitos humanos das pessoas LGBTQIA+ constantes de banco de dados administrado pelo Juízo das Execuções Penais.
§ 5º Os pareceres serão emitidos após entrevistas reservadas com a pessoa privada de liberdade que se declarou LGBTQIA+, devendo as perguntas focarem em aspectos de reconhecimento social, de vivência e experiências como uma pessoa LGBTQIA+.
§ 6º Após a emissão dos pareceres, serão ouvidos o Ministério Público e a pessoa declarante, que deverá sempre ser assistida juridicamente, seja por advogado(a) de sua livre escolha, seja por representante da Defensoria Pública.
§ 7º Após a instrução, o Juízo da Execução Penal deliberará sobre a manutenção ou não da pessoa autodeclarada LGBTQIA+ na unidade própria onde houver, ou masculina ou feminina ou na ala ou cela de convivência específica, conforme o caso.
Do direito ao nome social
Art. 13. Na unidade escolhida, a pessoa transexual, travesti, transmasculina ou não-binária tem direito à inclusão de seu nome social em todos os documentos produzidos e usados na unidade e, ainda, a ser chamada pelo nome social indicado, mesmo que em desacordo com o registro civil, por todos(as) os(as) policiais penais e demais profissionais envolvidos na execução penal.
Art. 14. O registro de admissão no estabelecimento prisional deverá conter campo específico para abranger a política de nome social, que indique a identidade reivindicada pela pessoa admitida no estabelecimento prisional. Caso não conste da guia de recolhimento à prisão, a informação deverá ser providenciada, inclusive, com solicitação ao Juízo da Execução Penal.
Art. 15. É assegurada a gratuidade na emissão e retificação de documentos civis das pessoas LGBTQIA+ em privação de liberdade, caso seja de seu interesse, providência que pode ser adotada pelo serviço social do sistema penal ou parcerias institucionais (art. 11, VII, c, da Resolução CNJ nº 348/2020).
Da busca ou revista pessoal
Art. 16. Busca ou revista pessoal é o ato de inspecionar o corpo e as vestes de uma pessoa com o intuito de preservar a segurança ou para encontrar algo que configure ilícito penal ou infração administrativa.
Art. 17. A busca pessoal em pessoa intersexo será realizada por policial penal masculino no caso de a pessoa revistada identificar-se com o gênero masculino, ou por policial feminina, na hipótese de a pessoa revistada identificar-se com o gênero feminino.
Art. 18. A busca pessoal em pessoas cisgênero será realizada de acordo com a identidade de gênero da pessoa abordada.
§ 1º A busca pessoal em homem cisgênero gay se dará por policiais penais masculinos e em mulheres cisgênero lésbicas ocorrerá por policiais penais femininas, habilitados(as) a fazer a revista.
§ 2º A busca pessoal em pessoas cisgênero bissexuais, assexuais ou pansexuais será realizada por policiais penais femininas, caso a pessoa revistada se identifique com o gênero feminino ou por policiais penais masculinos, na hipótese de se identificarem com o gênero masculino, em ambos os casos, por policiais com habilitação para fazer a revista.
Art. 19. A busca pessoal em pessoas transgênero será realizada de acordo com a identidade de gênero da pessoa revistada.
§ 1º Mulheres transexuais e travestis serão revistadas por policiais penais femininas;
§ 2º Homens transexuais e pessoas transmasculinas serão revistados por policiais penais femininas;
§ 3º Pessoas não-binárias serão revistadas por policiais penais femininas, caso tenham sido designadas mulheres ao nascer ou por policiais penais masculinos, caso tenham sido designados homens ao nascer, sem que isso signifique desconsideração de suas identidades, de forma a preservar suas integridades física e psíquica.
Art. 20. É vedado proceder à revista íntima em pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade em ambiente público, que exponha a nudez da pessoa revistada diante das demais, devendo-se proceder à revista íntima em ambiente reservado, que assegure a privacidade.
Parágrafo único. O gênero do(a) agente que procederá à revista íntima será determinado de acordo com a manifestação de vontade previamente afirmada pela pessoa LGBTQIA+ revistada, que deverá ser registrada por escrito.
Da visita
Art. 21. A visita de cônjuge, companheiro(a) em união estável, parentes e amigos(as) das pessoas LGBTQIA+ presas, deve ser realizada nos termos disciplinados nas regras gerais aplicáveis às demais pessoas em privação de liberdade, não sendo lícito o indeferimento do direito de visita com base na intersexualidade, na orientação afetiva, emocional e/ou sexual e/ou na identidade de gênero da pessoa presa.
Art. 22. Na hipótese de a pessoa LGBTQIA+ estar em pavilhão hospitalar ou enfermaria e impossibilitada de se locomover, ou em tratamento psiquiátrico, poderá receber visita no próprio local da internação ou em outro, de acordo com as regras da unidade. A visita ao(à) preso(a) internado(a) em unidades de saúde externas observará as regras da unidade.
Da revista de visitantes
Art. 23. Nos procedimentos de identificação e revista de visitantes LGBTQIA+ devem ser respeitadas sua intersexualidade, sua orientação afetiva, emocional e/ou sexual e sua identidade de gênero, vedadas quaisquer práticas discriminatórias.
Art. 24. Deve ser respeitado o nome social da pessoa visitante LGBTQIA+.
Art. 25. As visitantes que se identificarem como mulheres transexuais ou como travestis deverão ser tratadas por termos femininos, como senhora, ela, dela, entre outros. Os visitantes que se identificarem como homens trans ou pessoas transmasculinas deverão ser tratados por termos masculinos, como senhor, ele, dele, entre outros. Os(as) demais visitantes LGBTQIA+ deverão receber tratamento conforme sua manifestação de vontade.
Art. 26 A revista pessoal é a inspeção efetuada com fins de segurança, em todas as pessoas que pretendem ingressar em locais de privação de liberdade e que venham a ter contato direto ou indireto com pessoas privadas de liberdade ou com o interior do estabelecimento.
§ 1º A revista pessoal deve preservar a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada.
§ 2º A revista pessoal em ambiência prisional é de competência da polícia penal, vedada sua realização por agente privado.
§ 3º A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x, escâner corporal, dentre outras tecnologias e equipamentos de segurança capazes de identificar armas, explosivos, drogas ou outros objetos ilícitos, ou, excepcionalmente, de forma manual.
§ 4º Ressalvado o disposto no §3º, excepcionalmente, na ausência dos equipamentos mencionados no § 2º ou havendo fundada suspeita, poderá ser realizada a revista manual.
§ 5º Para efeitos desta Resolução, em caso da excepcionalidade da revista manual, a pessoa revistada permanecerá com as roupas íntimas.
§ 6º É vedada a revista vexatória, desumana ou degradante, notadamente:
I - desnudamento;
II - conduta que implique o toque ou a introdução de objetos nas cavidades corporais da
pessoa revistada;
III - uso de cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim;
IV - agachamento ou salto.
Art. 27. A revista manual em visitantes LGBTQIA+ será realizada por policial penal do gênero indicado pela visitante no momento de seu cadastro prévio para habilitação à visitação, respeitado o direito ao uso do nome social, sendo vedada a exposição de seus pertences pessoais associados à sua intersexualidade, à sua orientação afetiva, emocional e/ou sexual ou, ainda, à sua identidade de gênero de modo jocoso.
Art. 28. À pessoa visitante LGBTQIA+ que faça uso de acessórios, como apliques ou perucas, deve ser assegurado o direito de visita utilizando o acessório, desde que submetida a procedimentos de revista eletrônicos ou manuais.
Do acesso a itens
Art. 29. Observadas as disposições gerais da unidade prisional que dispõem sobre os objetos e materiais permitidos às pessoas privadas de liberdade e asseguradas as regras de segurança da unidade, é assegurado:
I - às pessoas intersexo, além dos itens a que todas as demais pessoas têm direito, o uso de roupas e o acesso controlado a utensílios e acessórios que preservem suas identidades de gênero autodeclaradas;
II - às travestis e às mulheres transexuais, além dos itens a que todas as demais pessoas têm direito, o acesso a vestimentas de acordo com sua identificação de gênero (feminina), à manutenção de seus cabelos compridos, inclusive mega hair, desde que fixo, ao uso controlado a pinças para extração de pelos e a produtos de maquiagem;
III - aos homens trans e pessoas transmasculinas, além dos itens a que todas as demais pessoas presas têm direito, além de vestimentas masculinas e ao binder ou topper (faixa ou colete de compressão de mamas) e ainda, se desejar, a manter o cabelo raspado.
IV - às pessoas não-binárias, além dos itens a que todas as demais pessoas presas têm direito, vestimentas, itens e acessórios de acordo com suas respectivas expressões de gênero.
Da visita íntima
Art. 30. É garantido às pessoas LGBTQIA+ em privação de liberdade o direito à visita íntima, caso seja adotada no estabelecimento penal, nos mesmos moldes concedido às demais pessoas presas, inclusive em relação aos cônjuges ou companheiros(as) que estejam custodiados(as) no mesmo estabelecimento.
§1º A formalização do casamento ou da declaração de união estável que envolva pessoa LGBTQIA+ privada de liberdade deverá ser facilitada e assegurada a partir do requerimento dos(as) interessados(as).
§2º É vedada a aplicação de sanção disciplinar devido à demonstração de afeto entre casais LGBTQIA+ no estabelecimento penal.
Da vedação de transferência compulsória
Art. 31. São vedados tratamentos desumanos e degradantes como transferências compulsórias entre celas, alas e/ou estabelecimentos -penais em razão da condição de pessoa declarada LGBTQIA+, salvo em situação de falsidade comprovada na autodeclaração.
Do direito à saúde
Art. 32. É garantida à população LGBTQIA+ em situação de privação de liberdade a atenção integral à saúde, atendidos os parâmetros da Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais - LGBT (Portaria do Ministério da Saúde 2.836, de 1º de dezembro de 2011) e da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional - PNAISP (Portaria Interministerial n° 1, de 2 de janeiro de 2014).
Parágrafo único. Caso o estabelecimento penal não disponha de assistência médica, farmacêutica ou odontológica, o atendimento deve ser garantido na rede de serviços do Sistema Único de Saúde-SUS ou rede parceira.
Art. 33. É garantido à pessoa privada de liberdade LGBTQIA+ o apoio psicológico e psiquiátrico, considerando o agravamento da saúde mental das pessoas LGBTQIA+, especialmente voltado à prevenção do suicídio, tratamento ginecológico, urológico e endocrinológico especializado, incluindo ainda o tratamento hormonal.
Art. 34. Devem ser assegurados os cuidados à pessoa convivendo com HIV e outras IST (infecções sexualmente transmissíveis), conforme a Lei n° 12.984, de 2 de junho de 2014, e outras que vierem a sucedê-la.
Parágrafo único. Devem ser garantidos os métodos de prevenção combinada de IST e HIV, com atenção especial à profilaxia pré (PrEP) e pós (PeP) exposição, bem como outras tecnologias de prevenção a serem adotadas pelo SUS.
Art. 35. Será garantido às pessoas LGBTQIA+ o sigilo das informações e diagnósticos constantes dos prontuários médicos, principalmente nos casos de informações sorológicas e outras IST, resguardando-se o direito constitucional à intimidade e assegurando-se, ainda, a testagem da pessoa privada de liberdade em relação a doenças infectocontagiosas, como HIV/TB (coinfecção entre HIV e tuberculose) e outras coinfecções, bem como outras doenças crônicas e infecciosas.
Do direito à educação
Art. 36. É garantido à pessoa LGBTQIA+, em igualdade de condições às demais pessoas privadas de liberdade, o acesso e a continuidade da sua formação educacional sob a responsabilidade do Estado conforme o preconizado na Lei de Execução Penal (LEP) e outros normativos que tratam o acesso à educação.
Parágrafo único. Deve ser assegurado a toda pessoa LGBTQIA+ em privação de liberdade o acesso à leitura, não apenas para a aquisição de conhecimentos gerais, mas também para garantia da remição da pena, e o acesso aos meios e ambientes educacionais que garantam este direito.
Do direito ao trabalho
Art. 37. É assegurada a não discriminação e o oferecimento de oportunidades em iguais condições em todas as iniciativas realizadas dentro do estabelecimento prisional, não podendo eventual isolamento ou alocação em espaços de convivência específicos representar impedimento ao oferecimento de vagas e oportunidades.
Art. 38. É assegurado à pessoa LGBTQIA+ privada de liberdade o oferecimento de vagas de capacitação e de trabalho nas oficinas ligadas ao Programa de Capacitação Profissional e Implementação de Oficinas Permanentes (PROCAP) ou a outro programa que venha a sucedê- lo, aliando-se à possibilidade de integração ao mercado de trabalho ainda dentro do sistema penitenciário.
Art. 39. É vedado o trabalho degradante ou humilhante em virtude da intersexualidade, da identidade de gênero e/ou da orientação afetiva, emocional e/ou sexual da pessoa privada de liberdade.
Do direito à assistência social
Art. 40.É direito das pessoas LGBTQIA+ o acesso à assistência social, devendo o serviço social dos estabelecimentos penais desenvolver ações contínuas dirigidas aos visitantes e às pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade, para garantia do respeito aos princípios de igualdade e à não discriminação e do direito ao autorreconhecimento.
Art. 41. Considerando a realidade de contato limitado ou por vezes inexistente entre pessoas LGBTQIA+ privadas de liberdade e suas famílias, o serviço social do sistema prisional deve desenvolver estratégias para incentivar e autorizar que visitantes de outra pessoa reclusa se cadastre como amigo(a)/visitante da pessoa LGBTQIA+ privada de liberdade e lhe forneça itens materiais em quantidade suficiente.
Art. 42. Ao gestor da unidade prisional cabe a articulação com os serviços sócio-assistenciais e o encaminhamento das pessoas LGBTQIA+ ao CRAS e ao CREAS (Centros de Referência da Assistência Social e Centros de Referência Especializados de Assistência Social), para acompanhamentos e encaminhamentos necessários.
Do auxílio-reclusão
Art. 43. O serviço social do sistema prisional deve fazer busca ativa junto à pessoa LGBTQIA+ e seus familiares acerca de informações para identificar se a pessoa privada de liberdade é segurada e possui família a ser beneficiada com o auxílio reclusão (Lei 7.210/84, art. 23, VI).
Do direito à assistência religiosa
Art. 44. É assegurado à pessoa LGBTQIA+ o direito à assistência religiosa, condicionada à sua expressa vontade, ou à de seu cônjuge ou companheiro(a), seguido por demais familiares, no caso de impossibilidade de manifestação da vontade, observada a liberdade de adesão às manifestações religiosas que desejar.
§1º A pessoa LGBTQIA+ privada de liberdade, no período da triagem/classificação, poderá informar sua religião e se deseja receber assistência dessa natureza, incluindo visitas e participação em celebrações religiosas no interior do estabelecimento prisional.
§ 2º É assegurada à pessoa LGBTQIA+, se desejar, a posse de livros de instrução religiosa.
§ 3º Deverá ser respeitada a negativa da pessoa LGBTQIA+ privada de liberdade em receber visita de qualquer representante religioso, ou participar de celebrações religiosas.
Da formação continuada de policiais penais e demais servidores(as)
Art. 45. O Estado deverá garantir a formação inicial e a capacitação continuada a todos(as) os(as) policiais penais e demais colaboradores envolvidos no âmbito da Execução Penal, considerando a perspectiva dos direitos humanos e os princípios de igualdade e não-discriminação de pessoas LGBTQIA+, com intuito de evitar quaisquer incorreções à legislação presente.
Parágrafo único. A capacitação deverá ser ministrada por profissional com comprovada experiência no tema e será oferecida no mínimo uma vez ao ano pelas Escolas de Gestão Penitenciária ou setor congênere estadual.
Da promoção da cidadania
Art. 46 A Administração Pública deve reservar um percentual de no mínimo 5% (cinco por cento) de vagas de trabalho remunerado voltadas às pessoas privadas de liberdade para a população LGBTQIA+ nos programas de inclusão ofertados pelas empresas privadas e/ou públicas que atuam em parceria com o Sistema Penitenciário.
Art. 47. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogada a Resolução Conjunta nº 1, de 15 de abril de 2014, do Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT e do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
DOUGLAS DE MELO MARTINS
Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
Membros do Grupo de Trabalho do CNPCP
ULYSSES DE OLIVEIRA GONÇALVES JÚNIOR
Presidente
MARCUS CASTELO BRANCO ALVES SEMERARO RITO
Relator
GRAZIELA PARO CAMPONI;
Conselheira
MÁRCIA DE ALENCAR ARAÚJO;
Conselheira
MAURÍCIO STEGEMANN DIETER
Conselheiro
SUSAN LUCENA RODRIGUES
Conselheira
PATRÍCIA VILLELA MARINO
Conselheira
PAULO AUGUSTO DE OLIVEIRA IRION
Conselheiro
JANAÍNA OLIVEIRA
Presidenta do Conselho Nacional de Direitos das Pessoas LGBTQIA+
Membros da Comissão do CNLGBTQIA+
ANDERSON CAVICHIOLI
Relator pelo Conselho Nacional de Direitos das Pessoas LGBTQIA+
BRUNA BENEVITES
Presidenta da CT de Monitoramento, Prevenção e Combate à Violência Contra a População LGBTQIA+ e representante da ANTRA no CNLGBTQIA+
FABIAN ALGARTE
Presidente da CT de Articulação Institucional, Planejamento , representante do IBRAT no CNLGBTQIA+
WALMIR SIQUEIRA
Presidente da CT Legislação e Normas - representante da CUT no CNLGBTQIA+
Douglas de Melo Martins
Presidente do Conselho
Janaína Oliveira
Presidente do CNLGBTQIA+
Anexo I
Glossário
I - Pessoas LGBTQIA+: o conjunto de pessoas Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis, Queer, Intersexo, Assexuais e outras identidades, como pessoas não-binárias, transmasculinas, entre outras, que têm em comum o fato de estarem fora dos padrões da congeneridade e da heterossexualidade.
II - Sexo biológico: a designação de sexo de uma pessoa, sob a perspectiva estritamente biológica, diz respeito à sua conformação física e anatômica, restringindo-se à mera verificação de fatores genéticos (cromossomos), gonadais (ovários ou testículos), genitais (pênis ou vagina) ou morfológicos (aspectos físicos externos gerais). Esse critério não define a identidade de gênero da pessoa e dá ensejo à ordenação, segundo sua designação sexual no nascimento, em pessoas:
- do sexo masculino;
- do sexo feminino;
- intersexo (com características sexuais ambíguas).
III - Intersexualidade: condição corporal na qual há uma variação em relação ao padrão cultural atribuído aos corpos masculino ou feminino, por razões de ambiguidade genital, combinações de fatores genéticos e aparência, e variações cromossômicas sexuais diferentes. Há várias formas de intersexualidade em razão das configurações dos cromossomos, a localização dos órgãos genitais e a coexistência de tecidos testiculares e de ovários. A intersexualidade refere-se a um conjunto amplo de variações dos corpos tidos como masculinos e femininos. São catalogadas na Medicina mais de 40 (quarenta) variações de intersexualidade. São designadas como pessoas intersexo.
IV - Gênero: assenta-se em fatores psicossociais e se refere à forma como culturalmente é identificada, no âmbito social, a expressão da masculinidade e da feminilidade, adotando-se como parâmetro, para tanto, o modo de ser de uma pessoa nas relações sociais. É por essa razão que sexo é biológico, diferentemente de gênero, que é uma construção social, pois este decorre de papéis construídos a partir de interações humanas no âmbito da sociedade, que podem sofrer interferência histórica e cultural.
V - Expressão de gênero: são as maneiras como o gênero é demonstrado socialmente, no uso de vestimentas, modo de falar e de estilo, de agir e de interagir.
VI - Identidade de gênero: traduz a forma individual de pertencimento ou vinculação ao universo masculino ou feminino, ou a nenhum deles. É a vivência interna e individual do gênero tal como a pessoa se sente, a qual pode ou não corresponder ao sexo/gênero que lhe foi atribuído no momento do nascimento. Sob este critério, temos:
- cisgeneridade: é a correspondência entre a identidade de gênero e o sexo/gênero designado no nascimento.
- transgeneridade: é a não correspondência entre a identidade de gênero e o sexo/gênero designado no nascimento. A transgeneridade pode envolver ou não a modificação da aparência ou a função corporal através de meios médicos, cirúrgicos ou de outra forma, sempre que seja livremente escolhida. É um termo "guarda-chuva", que pode ser desdobrado em:
VII - transexualidade: é a não correspondência entre a identidade de gênero e o sexo/gênero designado no nascimento, sendo que a característica da transexualidade é a pessoa identificar-se com o gênero oposto ao que lhe foi designado no nascimento. Independe da realização de qualquer procedimento cirúrgico ou médico. Sob este aspecto as pessoas transexuais podem ser:
- mulher transexual (mulher trans): é a pessoa que apesar de ter sido designada com o sexo/gênero masculino no nascimento, identifica-se como pertencente ao gênero feminino.
- homem transexual (homem trans): é a pessoa que apesar de ter sido designada com o sexo/gênero feminino no nascimento, identifica-se como pertencente ao gênero masculino.
VIII - transmasculinidade: identidade de gênero autônoma de uma pessoa que, apesar de ter sido designada com o sexo/gênero feminino no nascimento, identifica-se como pertencente ao gênero masculino.
IX - travestilidade: é uma identidade de gênero autônoma de uma pessoa que, apesar de ter sido designada como o sexo/gênero masculino no nascimento, identifica-se como travesti e deve ser tratada como pertencente ao gênero feminino.
X - não-binariedade: é a não identificação, quer com o gênero masculino, quer com o gênero feminino.
XI - autoidentificação ou autodeterminação: princípio jurídico que diz respeito à identidade de gênero de uma pessoa, segundo o qual é a pessoa, a partir da percepção de si (fator subjetivo) quem define sua identidade de gênero, e não suas características corporais, vale dizer, seu sexo biológico (fator objetivo). Dessa forma, havendo diferença entre o gênero definido no nascimento a partir do sexo biológico e o gênero com o qual a pessoa se identifica, este último deve prevalecer para todos os fins de direito. Este entendimento foi sedimentado no Parecer Consultivo nº 24/17, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de observância obrigatória pelo Brasil.
XII - orientação/condição afetiva, emocional e/ou sexual: diz respeito à atração afetiva, emocional e/ou sexual. Sob este critério, temos:
- heterossexualidade: capacidade de sentir atração afetiva, emocional, e/ou sexual por pessoas do gênero oposto. As pessoas que se identificam com a heterossexualidade são chamadas de heterossexuais.
- homossexualidade: capacidade de sentir atração afetiva, emocional e/ou sexual por pessoas do mesmo gênero. As pessoas que se identificam com a homossexualidade são chamadas de homossexuais.
A homossexualidade pode ser:
- masculina: homem sente atração por outro homem. É chamado gay.
- feminina: mulher sente atração por outra mulher. É chamada lésbica.
- bissexualidade: capacidade de sentir atração afetiva, emocional e/ou sexual por pessoas de ambos os gêneros. As pessoas que se identificam com a bissexualidade são chamadas bissexuais.
- assexualidade: é a reduzida, rara ou nenhuma atração sexual, podendo ou não estar acompanhada de desejo afetivo e/ou emocional. A pessoa que assim se identifica é chamada assexual - e não assexuado(a). Utiliza-se a sigla "ace" para designá-la. Quando a reduzida, rara ou ausência de atração diz respeito aos sentimentos, esta pessoa é designada arromântica. Utiliza-se a sigla "aro" para designá-la.
- pansexualidade: capacidade de sentir atração afetiva, emocional e/ou sexual por pessoas, independentemente do gênero com os quais estas pessoas se identificam ou se apresentam socialmente. São designadas pessoas pansexuais.
XIII - Queer: palavra de língua inglesa com vários significados. O mais abrangente designa tudo que está fora de padrões normativos. Na sigla LGBTQIA+, designa pessoas que rejeitam quaisquer rótulos referentes a gênero e sexualidade. Também pode significar os estudos acadêmicos chamados de queer, que lançam as bases críticas de categorias como minorias, gênero e identidade e atribuem ênfase sobre o discurso e sua (des)construção.
XIV - Nome social: política pública de inclusão social, que obriga a utilização da designação pela qual a pessoa transgênero (transexual, travesti, transmasculina ou não-binária) se identifica e é socialmente reconhecida (art. 1º, II, do Decreto Federal n. 8.727/16). O direito ao nome e ao tratamento adequado quanto à identidade de gênero constitui um pilar básico do respeito aos direitos fundamentais, em especial à igualdade e à não-discriminação.
LEI Nº 14.843, DE 11 DE ABRIL DE 2024
Altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a monitoração eletrônica do preso, prever a realização de exame criminológico para progressão de regime e restringir o benefício da saída temporária.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Esta Lei, denominada Lei Sargento PM Dias, altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a monitoração eletrônica do preso, prever a realização de exame criminológico para progressão de regime e restringir o benefício da saída temporária.
Art. 2º A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 66. ........................................................................................................................
..................................................................................................................................................
V - .................................................................................................................................
..................................................................................................................................................
j) a utilização do equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado nas hipóteses legais;
.........................................................................................................................................” (NR)
“Art. 112. ......................................................................................................................
§ 1º Em todos os casos, o apenado somente terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, e pelos resultados do exame criminológico, respeitadas as normas que vedam a progressão.
.........................................................................................................................................” (NR)
“Art. 114. ......................................................................................................................
..................................................................................................................................................
II - apresentar, pelos seus antecedentes e pelos resultados do exame criminológico, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade, ao novo regime.
.........................................................................................................................................” (NR)
“Art. 115. O juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, entre as quais, a fiscalização por monitoramento eletrônico, sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias:
.........................................................................................................................................” (NR)
“Art. 122. ......................................................................................................................
I - (VETADO);
I - (revogado); (Promulgação partes vetadas)
..................................................................................................................................................
III - (VETADO).
III - (revogado). (Promulgação partes vetadas)
..................................................................................................................................................
§ 2º Não terá direito à saída temporária de que trata o caput deste artigo ou a trabalho externo sem vigilância direta o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo ou com violência ou grave ameaça contra pessoa.
§ 3º Quando se tratar de frequência a curso profissionalizante ou de instrução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes.” (NR)
“Art. 132. ......................................................................................................................
..................................................................................................................................................
§ 2º ...............................................................................................................................
..................................................................................................................................................
e) utilizar equipamento de monitoração eletrônica.” (NR)
“Art. 146-B. ..................................................................................................................
..................................................................................................................................................
VI - aplicar pena privativa de liberdade a ser cumprida nos regimes aberto ou semiaberto, ou conceder progressão para tais regimes;
VII - aplicar pena restritiva de direitos que estabeleça limitação de frequência a lugares específicos;
VIII - conceder o livramento condicional.
.........................................................................................................................................” (NR)
“Art. 146-C. ..................................................................................................................
Parágrafo único. ...........................................................................................................
..................................................................................................................................................
VIII - a revogação do livramento condicional;
IX - a conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.” (NR)
Art. 3º Ficam revogados os seguintes dispositivos da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal):
I - (VETADO); e
I - incisos I e III do caput do art. 122; e (Promulgação partes vetadas)
II - art. 124.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 11 de abril de 2024; 203o da Independência e 136o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Silvio Luiz de Almeida
Anielle Francisco da Silva
Enrique Ricardo Lewandowski
Jorge Rodrigo Araújo Messias
RESOLUÇÃO CNPCP Nº 34, DE 24 DE ABRIL DE 2024
Define diretrizes e recomendações referentes à assistência socio-espiritual e à liberdade religiosa das pessoas privadas de liberdade.
O Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no uso das atribuições legais que lhe conferem o art. 64, I, da Lei nº 7.210/84 e o art. 69 do Decreto nº 11.348, de 1º de janeiro de 2023, e
CONSIDERANDO que incumbe ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), dentre outras atribuições, nos termos do art. 64 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal - LEP), "I - propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e execução das penas e das medidas de segurança; II contribuir na elaboração de planos nacionais, sugerindo metas e prioridades da política criminal e penitenciária, [...] V - elaborar programa nacional penitenciário de formação e aperfeiçoamento do servidor, [...] VIII - inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, bem assim informar-se, mediante relatórios do Conselho Penitenciário, requisições, visitas ou outros meios, acerca do desenvolvimento da execução penal nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo às autoridades dela incumbida as medidas necessárias ao seu aprimoramento";
CONSIDERANDO que a Constituição da República estabelece que o Brasil é um Estado laico, assegurando a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, o livre exercício de cultos religiosos e a prestação de assistência religiosa nos espaços de privação de liberdade;
CONSIDERANDO ainda o disposto no Art. 19 da CF, que dispõe: "Art. 19 - É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.";
CONSIDERANDO que a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas prevê, em seu artigo XVIII, que toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião, e que esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença, de manifestar sua crença pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular;
CONSIDERANDO que as Regras Mínimas da Organização das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, assim como a Resolução nº 8, de 9 de novembro de 2011 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, preveem a assistência religiosa em estabelecimentos penais, com liberdade de culto e a participação nos serviços organizados pelo estabelecimento penal, assegurando a presença de representantes religiosos, com autorização para organizar serviços litúrgicos e fazer visita pastoral a adeptos de sua religião;
CONSIDERANDO que as Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras, ou Regras de Bangkok, em suas Regras 54 e 55, declaram que as mulheres presas têm diferentes tradições religiosas e culturais e devem ser respeitadas, devendo as autoridades prisionais oferecer programas e serviços abrangentes que incluam essas necessidades, em consulta com as próprias presas e os grupos pertinentes;
CONSIDERANDO que a Declaração Interamericana de Direitos Humanos ao estabelecer "Princípios e Boas Práticas", em seu Inc. XV declara: "As pessoas privadas de liberdade terão liberdade de consciência e de religião, inclusive a professar, manifestar, praticar e conservar sua religião, ou mudar de religião, segundo sua crença [...];
CONSIDERANDO que a Lei Nº 7.210, Lei de Execução Penal (LEP) prevê a assistência religiosa aos presos, bem como a liberdade de culto, sendo-lhes garantida a participação nos serviços organizados no estabelecimento penal;
CONSIDERANDO que Lei Nº 9.982 de 14 de julho de 2000, dispõe sobre a prestação de assistência religiosa em estabelecimentos prisionais;
CONSIDERANDO que a Resolução CNPCP Nº 08 de 09 de novembro de 2011 no seu Art. 1º, IN IV apresenta como princípio que "à pessoa presa será assegurado o direito à expressão de sua consciência, filosofia ou prática de sua religião de forma individual ou coletiva, devendo ser respeitada sua vontade de participação, ou de abster-se de participar de atividades de cunho religioso";
CONSIDERANDO a Resolução nº 287, de 25 de junho de 2019 do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece procedimentos ao tratamento das pessoas indígenas acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade, e dá diretrizes para assegurar os direitos dessa população no âmbito criminal do Poder Judiciário;
CONSIDERANDO a Resolução nº 405, de 06 de julho de 2021 do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece procedimentos para o tratamento das pessoas migrantes custodiadas, acusadas, rés, condenadas ou privadas de liberdade, inclusive em prisão domiciliar e em outras formas de cumprimento de pena em meio aberto, em cumprimento de alternativas penais ou monitoração eletrônica e confere diretrizes para assegurar os direitos dessa população no âmbito do Poder Judiciário;
CONSIDERANDO a Recomendação nº 119, de 28 de outubro de 2021 do Conselho Nacional de Justiça, que recomenda a adoção de procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para a garantia dos direitos à assistência e diversidade religiosa em suas mais diversas matrizes e à liberdade de crença nas unidades de privação e restrição de liberdade; resolve:
Fixar diretrizes mínimas e recomendações referentes à assistência socio-espiritual às pessoas privadas de liberdade no Brasil.
CAPÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E GARANTIAS
Art. 1º Os direitos fundamentais de liberdade de consciência, de crença e de expressão serão garantidos à pessoa privada de liberdade, observadas as seguintes garantias:
I - será assegurado o direito de professar qualquer religião ou crença, bem como, o exercício da liberdade de consciência aos ateus e agnósticos e adeptos de filosofias não religiosas;
II - será assegurada a atuação de diferentes grupos religiosos em igualdade de condições, majoritárias ou minoritárias, vedado o proselitismo religioso e qualquer forma de discriminação, de estigmatização e de racismo religioso;
III - a assistência socio-espiritual não será instrumentalizada para fins de disciplina, correcionais ou para estabelecer qualquer tipo de regalia, benefício ou privilégio, e será garantida mesmo à pessoa privada de liberdade submetida a sanção disciplinar, regime disciplinar diferenciado e/ou em cumprimento de pena em unidade prisional federal;
IV - à assistência socio-espiritual será garantida atuação de caráter humanitário, respeitando esse elemento como fundamental às diversas religiões;
V - à pessoa privada de liberdade será assegurado o direito à expressão de sua consciência, filosofia ou prática de sua religião de forma individual ou coletiva, devendo ser respeitada a sua vontade de participar ou de se abster das atividades de cunho religioso;
VI - será garantido à pessoa privada de liberdade o direito de mudar de religião, consciência ou filosofia a qualquer tempo, sem prejuízo da sua situação de privação de liberdade;
VII - dentro dos limites legais, o conteúdo da prática religiosa deverá ser definido pelo grupo religioso e pelas pessoas privadas de liberdade, garantindo-se que as especificidades de cada religião ou crença sejam consideradas; há de respeitar-se, portanto, a latitude legal, integralidade e diversidade de cada religião ou crença, sendo que sob nenhuma hipótese poderá haver interferência estatal no respectivo conteúdo;
VIII - será assegurado aos representantes religiosos das instituições religiosas o acesso a todos os estabelecimentos de privação de liberdade dentro território nacional.
Art. 2º É assegurado ao preso o respeito à sua individualidade, entendendo o caráter multifacetário das dimensões humanas, sem perder sua particularidade, assegurado o respeito a escolha da religião de sua preferência, bem como a mudar de religião ou filosofia não religiosa, ou ainda não professar nenhuma religião.
Parágrafo único. Nenhuma pessoa em privação de liberdade poderá ser obrigada a aderir a determinada linha religiosa como requisito para transferência, admissão ou permanência em espaço de privação de liberdade.
Art. 3º Cumpre à Secretaria de Administração Penitenciária garantir ao interno acesso a assistência socio-espiritual, sem interferência dogmática ou litúrgica dos representantes estatais, assegurada a total liberdade de ensino de cada segmento ou confissão de fé desde que dentro dos limites legais.
Art. 4º É vedada:
I - a participação de servidor público empregado privado ou profissional liberal como voluntário religioso nos espaços de privação de liberdade em que tenha atuação profissional direta;
II - a interferência de agentes de forças de segurança do sistema prisional, públicos ou privados, no conteúdo da prática religiosa;
III - a suspensão do ingresso de representantes religiosos/as por decisão unilateral da administração do espaço de privação de liberdade, sendo necessária a oitiva do responsável pela organização religiosa, assegurando-se o direito de defesa e o amplo contraditório;
IV - a suspensão da organização religiosa por decisão unilateral da administração do estabelecimento de privação de liberdade;
V - a suspensão do ingresso de representantes religiosos/as por motivos vinculados à expressão de sua religião ou ao viés humanitário da assistência socio-espiritual, estando a discriminação sujeita à responsabilização pela Lei nº 13.869/2019 e, no que tange às religiões de matrizes africanas, aos crimes previstos na Lei nº 7.716/1989;
VI - a submissão dos voluntários religiosos à revista vexatória, sendo que, na falta de equipamentos adequados para eletrônica, estes deverão ser submetidos à mesma metodologia adotada para o ingresso dos demais servidores da unidade prisional;
VII - a obrigatoriedade de roupa específica a ser utilizada pelos representantes religiosos/as, salvo a hipótese de a roupa coincidir com a cor utilizada pelas pessoas presas e/ou dos/as agentes de forças de segurança do Estado;
VIII - o impedimento de ingresso e permanência no estabelecimento de privação de liberdade devido a roupas características da religião ou crença dos/as representantes religiosos/as;
IX - a comercialização de itens religiosos ou o pagamento de contribuições religiosas das pessoas privadas de liberdade às instituições religiosas nos espaços de privação de liberdade.
CAPÍTULO II
DA ASSISTÊNCIA SOCIO-ESPIRITUAL
Art. 5º A assistência socio-espiritual constitui-se de:
I - trabalho de assistência espiritual;
II - aconselhamento coletivo ou individual;
III - oração e estudo;
IV - ministração de prática litúrgica e ritualística dos mais diversos segmentos religiosos, desde que não implique risco à segurança e à saúde dos custodiados;
V - evento previamente planejado e ajustado junto à direção do estabelecimento de privação de liberdade, que poderá, em situações e datas especificas, contar com a participação de familiares;
VI - projetos culturais, educacionais e sociais vinculados à assistência socio-espiritual, os quais deverão ser previamente apreciados pela Secretaria de Administração Penitenciária, para análise da observância das normais institucionais.
Art. 6º - A administração do espaço de privação de liberdade deverá garantir meios para que se realize o atendimento pessoal privado ou coletivo da pessoa privada de liberdade com os/as representantes religiosos/as, cabendo-lhe observar, dentre tais deveres, que:
I - será garantido o sigilo do atendimento socio-espiritual e humanitário;
II - será garantida a entrada de materiais de cunho religioso necessários à continuidade ou aprofundamentos dos ensinamentos de cada segmento religioso;
III - quanto às pessoas indígenas, estrangeiras, de religiões de matrizes africanas ou de religiões minoritárias, em privação de liberdade, seus rituais, orações e dietas devem ser observados e respeitados desde que não comprometam a segurança e a saúde das pessoas.
Art. 7º A pessoa em privação de liberdade poderá ter consigo livros de prática e de ensino de sua confissão.
Art. 8º A direção do estabelecimento de privação de liberdade deverá disponibilizar os espaços de assistência socio-espiritual com os equipamentos necessários ao desenvolvimento das atividades, tais como som, instrumentos musicais, microfone, data show e etc, caso não disponha de equipamento da própria unidade, poderá ser autorizado o ingresso de tais equipamentos, sem prejuízo dos protocolos de segurança interna.
Art. 9º Em situações específicas, a direção do estabelecimento de privação de liberdade poderá autorizar o registro fotográfico e audiovisual de eventos e celebrações, ou projeção de filmagens, desde que previamente agendado, cabendo à direção designar servidor(es) para acompanhamento dos registros e projeção.
§ 1º A direção do estabelecimento de privação de liberdade deve ser informada previamente acerca dos equipamentos que serão utilizados, para que a devida autorização seja disponibilizada aos interessados e afixada na portaria do estabelecimento.
§ 2º A liberação das imagens produzidas para utilização do responsável pelo grupo religioso será procedida mediante termos de autorização dos internos participantes do evento e prévia avaliação da direção do estabelecimento de privação de liberdade.
Art. 10 A direção do estabelecimento de privação de liberdade poderá autorizar a realização da assistência socio-espiritual em período noturno, desde que compatível com a segurança do estabelecimento e das pessoas.
CAPÍTULO III
DAS INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS
Art. 11 São deveres das organizações que prestam assistência socio-espiritual, bem como de seus representantes:
I - agir de forma cooperativa com as demais organizações religiosas;
II - informar-se e cumprir os procedimentos normativos previstos nesta Resolução;
III - comunicar, sempre que possível, à administração do espaço de privação de liberdade sobre eventual impossibilidade de realização da atividade socio-espiritual, a fim da unidade penitenciária reprogramar suas atividades.
IV- seguir as orientações com relação às normas e procedimentos de segurança estabelecidas pela Secretaria de Administração Penitenciária, conforme regime de cada espaço de privação de liberdade;
V- manter os voluntários atualizados sobre as orientações procedentes da Secretaria de Administração Penitenciária;
Art. 12 As instituições religiosas que desejem prestar assistência socio-espiritual e humanitária às pessoas presas deverão ser legalmente constituídas, por pelo menos 1 (um) ano, resguardadas as exceções previstas no §3º deste artigo.
§ 1º As instituições religiosas deverão se cadastrar na Secretaria de Administração Penitenciária.
§ 2º Para o cadastro das instituições religiosas referidas no parágrafo anterior, deverão ser apresentados junto com requerimento de cadastro os seguintes documentos ao órgão estatal responsável:
a) requerimento do dirigente da organização ou de seu representante competente oumajoritário, acompanhado de cópia do documento de identidade pessoal, do tipo RG ou RNE (Registro Nacional de Estrangeiro), do CPF e Título de Eleitor, se for o caso;
b) cópia autenticada dos estatutos sociais, da ata de eleição da última diretoria ou de carta assinada pelo/a dirigente da organização;
c) cópia do comprovante de endereço atualizado da organização.
§3º As religiões de tradição oral, dentre elas as matrizes africanas e as religiões dos povos originários, bem como outros segmentos análogos, quando não possuidores dos documentos a que se refere o inciso b) do §2o do presente artigo, poderão comprovar sua constituição e regularidade por meio de declaração prestada pelo representante religioso, mediante formulário próprio, cabendo à administração, caso julgue necessário, a verificação in loco dos dados fornecidos.
§4º A renovação do cadastro deverá ser feita em até 45 (quarenta e cinco) dias, para menos ou para mais da data de validade, ficando neste período garantida a continuidade dos trabalhos independentemente na análise dos documentos, a tempo e modo, pelo órgão competente.
§5º Os órgãos competentes devem deliberar sobre o cadastro e renovação das organizações no prazo máximo de 20 (vinte) dias corridos a partir da data da solicitação.
CAPÍTULO IV
DO VOLUNTÁRIO RELIGIOSO
Art. 13 A assistência socio-espiritual será prestada por agentes voluntários ligados a instituições religiosas previamente cadastradas junto a Secretaria de Administração Penitenciária, sendo seu representante legal o responsável pela indicação do voluntário.
Art. 14 São requisitos indispensáveis ao credenciamento do agente voluntário:
I- apresentar conduta ilibada, ética e moral, de acordo com a documentação exigida no cadastramento;
II- não possuir familiares ou parentes de até segundo grau presos na unidade prisional na qual pretenda realizar a atividade religiosa;
III- ser credenciado pela entidade religiosa a que pertence;
IV- ser maior de 18 anos e residente no país;
V- se egresso prisional, ter decorrido período suficiente para depuração da pena cumprida, mediante certidão de extinção de punibilidade.
Art. 15 O credenciamento do agente voluntário deverá ser solicitado mediante requerimento ao estabelecimento de privação de liberdade, subscrito pelo dirigente da organização religiosa previamente cadastrada nos termos do art. 12, § 1º desta Resolução:
a) cópia do documento de identidade pessoal do tipo RG ou RNE, se for o caso;
b) cópia do Cadastro de Pessoa Física;
c) 2 (duas) fotos no formato 3x4, impressas ou digitalizadas;
d) declaração por escrito, assinada pelo dirigente da organização religiosa, atestando que o/a representante é membro da instituição.
§ 1º A aprovação do cadastro do voluntário da atividade socio-espiritual no espaço de privação de liberdade dependerá de prévia análise e aprovação da Secretaria de Administração Penitenciária.
§ 2º Cumprido os requisitos para efetivação da assistência socio-espiritual, o candidato receberá tratamento isonômico dado aos demais voluntários sem qualquer discriminação.
§ 3º O voluntário religioso atuante que passar a ter algum familiar ou parente preso, deverá informar à direção do estabelecimento de privação de liberdade, a fim de prestar a assistência socio-espiritual em unidade distinta daquela em que o respectivo parente esteja custodiado.
§4º Não será exigida formação teológica ou em áreas correlatas.
§ 5º Do indeferimento do cadastro do voluntário religioso caberá requerimento para revisão da decisão dirigido ao Secretário de Administração Prisional.
CAPÍTULO V
DO ESPAÇO FÍSICO APROPRIADO
Art. 16 As Unidades Prisionais a serem construídas deverão contemplar espaços apropriados e exclusivos para as atividades da assistência socio-espiritual isento de símbolos, características ou customização que classifique ou indique qualquer religião específica, assim como as unidades existentes devem disponibilizar espaços afins, observando o princípio da neutralidade religiosa do Estado.
§ 1º Durante a atividade de cada segmento religioso, será garantido a liberdade de culto com uso de símbolos, ritos, liturgias e objetos religiosos, salvo itens que comprovadamente ofereçam risco à segurança e saúde.
§ 2º A definição dos itens que oferecem risco à segurança e saúde será feita pela Secretaria de Administração Penitenciária, que deverá demonstrar a absoluta necessidade da medida e a inexistência de meio alternativo para atingir o mesmo fim.
§ 3º Caberá à administração penitenciária a adequação, aparelhamento e manutenção dos espaços destinado à assistência socio-espiritual, admitindo-se para este fim, doações por parte das instituições religiosas desde que, de forma definitiva, documentada em termo próprio, e para uso comum de todas as instituições que prestem assistência na unidade.
§ 4º Onde não houver local apropriado para as atividades socio-espirituais, a Direção do espaço de privação de liberdade deverá providenciar ou adequar meios alternativos para este fim.
§ 5º Será assegurado o ingresso de representantes religiosos aos locais de culto, aos locais e confissão religiosa ou atendimento espiritual, bem como aos locais onde houver pessoas em cumprimento de faltas disciplinares ou regime disciplinar diferenciado - RDD, sempre que não for possível ou recomendável o deslocamento dessas pessoas ao local de culto religioso.
CAPITULO VI
DA ADMINISTRAÇÃO PRISIONAL
Art. 17 - São deveres dos Espaços de Privação de Liberdade:
I - realizar busca ativa da preferência religiosa do preso no momento do acolhimento visando promover a garantia da assistência das religiões existentes, sejam majoritárias ou minoritárias;
II - realizar a busca ativa dos seguimentos religiosos, aos quais haja manifestação de preferência por parte da pessoa privada de liberdade e que porventura não tenham representação no ambiente de privação de liberdade.
III- garantir que o grupo religioso acesse o local destinado às atividades socio-espirituais no horário agendado, evitando expor os voluntários à risco ou a espera prolongada e às más condições climáticas;
IV- definir espaço adequado para realização das atividades socio-espirituais, bem como providenciar a estrutura de apoio, como materiais e equipamentos necessários para a realização das celebrações ou eventos;
V- autorizar, caso o espaço de privação de liberdade não possua, a entrada de materiais e equipamentos necessários para realizar as atividades de assistência socio espiritual, por escrito, em duas vias, mantendo uma via afixada na portaria de acesso do espaço de privação de liberdade, ou outro canal interno, e a outra sendo entregue ao coordenador do grupo;
VI- assegurar às pessoas privadas de liberdade o acesso e permanência na realização das atividades socio-espirituais, sem interferência e sem interrupção antes do tempo formalmente previsto até o encerramento das atividades, salvo quando for estritamente necessário;
VII - garantir todas as medidas relativas à segurança dos membros dos grupos religiosos que adentram ao estabelecimento de privação de liberdade para a realização das atividades previstas;
VIII - comunicar em tempo hábil aos coordenadores dos grupos religiosos a respeito da necessidade de cancelamento eventual das atividades, em situações internas que implique em risco à segurança, a fim de evitar deslocamentos desnecessários;
IX - manter atualizados e acessíveis os dados e as informações das atividades dos grupos religiosos no estabelecimento de privação de liberdade, para subsidiar o monitoramento realizado pela Secretaria de Administração Penitenciária;
X - comunicar por escrito a Secretaria de Administração Penitenciária intercorrências relacionadas ao voluntário ou grupo religioso, que prejudiquem o desenvolvimento do serviço e na rotina da unidade;
Art. 18 A Secretaria de Administração Penitenciária deverá definir qual órgão de sua estrutura administrativa será responsável pelo cadastramento das instituições religiosas, e pela apreciação dos requerimentos de revisão do indeferimento do cadastro do voluntário religioso junto aos estabelecimentos de privação de liberdade.
§ 1º Deverá ainda assessorar a gestão prisional nas questões de assistência religiosa, bem como recomendar ações para o melhor desempenho do atendimento religioso nos estabelecimentos de privação de liberdade, e oferecer informação e formação aos profissionais do sistema prisional, com o objetivo de qualificar e promover a compreensão do servidor sobre o direito a assistência socio-espiritual, seu escopo na política criminal e sua inviolabilidade prevista na Constituição Federal e demais legislações.
2º As escolas penitenciárias ou entidades similares deverão adaptar a matriz curricular dos cursos de formação quanto aos temas desta Resolução, bem como a legislação afeta ao tema, no prazo de um ano, a fim de contemplar a fundamentação jurídica do direito a assistência religiosa.
CAPITULO VII
DAS RECOMENDAÇÕES AOS ÓRGÃOS DE EXECUÇÃO PENAL
Art. 19 As Secretarias de Administração Penitenciária, devem assegurar a prestação de assistências socio-espiritual, por meio das seguintes ações, sem prejuízo das ações já existentes:
I - oferecer informação e formação aos profissionais do sistema sobre as necessidades específicas relacionadas às religiões, consciência e filosofia, bem como suas respectivas práticas, incluindo rituais, objetos, datas sagradas e comemorativas, períodos de oração, higiene, alimentação e a assistência humanitária, para promover a garantia da assistência socio-espiritual de maneira laica, vedado o proselitismo religioso por parte dos agentes do estado, garantindo-se a livre escolha de cada indivíduo;
II - incluir nas grades curriculares dos cursos de formação de pessoal, onde ainda não exista, legislação sobre assistência religiosa em ambiente penitenciário.
III - manter cadastro atualizado de organizações e de seus representantes devidamente instituídos;
IV - atualizar seus regimentos internos de forma a contemplar nas rotinas os dias específicos em que deve haver assistência religiosa (ou socio-espiritual), bem como os locais em que deve ocorrer, os horários, os requisitos, as regras de segurança a serem observadas, e demais disposições pertinentes;
V - promoção de diálogo com os representantes religiosos, conselhos religiosos de todos os segmentos disponíveis, visando compreender as dificuldades e encontrar soluções para; a falta de espaços físicos adequados, a quantidade reduzida de ministros voluntários ou contratados, o baixo quantitativo de servidores, dentre outros fatores, a fim de que tais circunstancias não causem o cerceamento do direito a assistência socio-espiritual;
VI - que promovam estratégias efetivas para cumprimento da presente resolução.
Art. 20 - Recomendar à Secretaria Nacional de Políticas Penitenciárias, que:
I - promova ciclos de debate, pelo menos uma vez ao ano (simpósios, workshops, seminários) sobre compartilhamento de boas práticas de assistência religiosa em unidades prisionais;
II - apliquem as recomendações constantes dos itens desta resolução, ao Sistema Penitenciário Federal;
III - inclua na matriz curricular dos servidores penitenciários, por meio da Escola Nacional de Serviços Penais, matéria referente à legislação sobre assistência religiosa nos espaços de privação de liberdade;
IV- repasse recurso financeiro aos entes federados para estruturação e adequação dos espaços destinados a realização da assistência socio-espiritual;
V - realize pesquisas, estudos e produção de informação, direcionados aos sistemas prisionais Estaduais e Federal, e promova estratégias efetivas para o cumprimento da presente resolução.
CAPITULO IX
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 21 A suspensão do ingresso de representantes religiosos por decisão da administração penitenciária deverá ser comunicada com antecedência de 24 horas e só pode ocorrer por motivo justificado, devendo em qualquer caso ser fundamentada e registrada por escrito, dando- se ciência aos interessados.
Parágrafo Único. Da suspensão de ingresso caberá requerimento para revisão da decisão dirigido ao Secretário de Administração Prisional.
Art. 22 Será permitida a doação de itens às pessoas presas por parte das instituições religiosas, desde que respeitadas as regras do estabelecimento prisional quanto ao procedimento de entrega e de itens autorizados.
Art. 23 Contra as decisões administrativas decorrentes desta resolução, aplica-se o procedimento judicial previsto nos artigos 194 e seguintes da LEP.
Art. 24 Revoga-se a Resolução CNPCP Nº 08 de 09 de novembro de 2011.
Art. 25 Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação.
Douglas de Melo Martins
Presidente do Conselho
Patrícia Nunes Naves
Presidente do GT de Assistência Religiosa
Bruno César Gonçalves da Silva
Relator
Diego Mantovaneli do Monte
Membro
Emerson Davis Leônidas Gomes
Membro
Graziela Paro Caponi
Membro
Patrícia Villela Marino
Membro
LEI Nº 14.994, DE 9 DE OUTUBRO DE 2024
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Os arts. 92, 129, 141 e 147 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 92. ......................................................................................................
.....................................................................................................................
II – a incapacidade para o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar, contra filho, filha ou outro descendente, tutelado ou curatelado, bem como nos crimes cometidos contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código;
.....................................................................................................................
§ 1º Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença pelo juiz, mas independem de pedido expresso da acusação, observado o disposto no inciso III do § 2º deste artigo.
§ 2º Ao condenado por crime praticado contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código serão:
I – aplicados os efeitos previstos nos incisos I e II do caput deste artigo;
II – vedadas a sua nomeação, designação ou diplomação em qualquer cargo, função pública ou mandato eletivo entre o trânsito em julgado da condenação até o efetivo cumprimento da pena;
III – automáticos os efeitos dos incisos I e II do caput e do inciso II do § 2º deste artigo.” (NR)
“Lesão corporal
Art. 129. ......................................................................................................
Violência doméstica
§ 9º .............................................................................................................
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
....................................................................................................................
§ 13. Se a lesão é praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.” (NR)
“Disposições comuns
Art. 141. .....................................................................................................
§ 3º Se o crime é cometido contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.” (NR)
“Ameaça
Art. 147. ......................................................................................................
§ 1º Se o crime é cometido contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A deste Código, aplica-se a pena em dobro.
§ 2º Somente se procede mediante representação, exceto na hipótese prevista no § 1º deste artigo.” (NR)
Art. 2º O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte art. 121-A:
“Feminicídio
Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino:
Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.
§ 1º Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime envolve:
I – violência doméstica e familiar;
II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
§ 2º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime é praticado:
I – durante a gestação, nos 3 (três) meses posteriores ao parto ou se a vítima é a mãe ou a responsável por criança, adolescente ou pessoa com deficiência de qualquer idade;
II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental;
III – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima;
IV – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);
V – nas circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do art. 121 deste Código.
Coautoria
§ 3º Comunicam-se ao coautor ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do crime previstas no § 1º deste artigo.”
Art. 3º O art. 21 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais), passa a vigorar com a seguinte redação, numerando-se o atual parágrafo único como § 1º:
“Art. 21. .......................................................................................................
§ 1º ...............................................................................................................
§ 2º Se a contravenção é praticada contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), aplica-se a pena em triplo.” (NR)
Art. 4º Os arts. 41, 86 e 112 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 41. ......................................................................................................
.....................................................................................................................
§ 1º Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos ou restringidos mediante ato motivado do juiz da execução penal.
§ 2º O preso condenado por crime contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), não poderá usufruir do direito previsto no inciso X em relação à visita íntima ou conjugal.” (NR)
“Art. 86. ......................................................................................................
.....................................................................................................................
§ 4º Será transferido para estabelecimento penal distante do local de residência da vítima, ainda que localizado em outra unidade federativa, inclusive da União, o condenado ou preso provisório que, tendo cometido crime de violência doméstica e familiar contra a mulher, ameace ou pratique violência contra a vítima ou seus familiares durante o cumprimento da pena.” (NR)
“Art. 112. ....................................................................................................
VI-A – 55% (cinquenta e cinco por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de feminicídio, se for primário, vedado o livramento condicional;
...........................................................................................................” (NR)
Art. 5º A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar acrescida do seguinte art. 146-E:
“Art. 146-E. O condenado por crime contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 1º do art. 121-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), ao usufruir de qualquer benefício em que ocorra a sua saída de estabelecimento penal, será fiscalizado por meio de monitoração eletrônica.”
Art. 6º O art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 1º ........................................................................................................
I – homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por 1 (um) só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VII, VIII e IX);
......................................................................................................................
I-B – feminicídio (art. 121-A);
.............................................................................................................” (NR)
Art. 7º O art. 24-A da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 24-A. ......................................................................................................
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
...............................................................................................................” (NR)
Art. 8º O art. 394-A do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 394-A. Os processos que apurem a prática de crime hediondo ou violência contra a mulher terão prioridade de tramitação em todas as instâncias.
§ 1º Os processos que apurem violência contra a mulher independerão do pagamento de custas, taxas ou despesas processuais, salvo em caso de má-fé.
§ 2º As isenções de que trata o § 1º deste artigo aplicam-se apenas à vítima e, em caso de morte, ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, quando a estes couber o direito de representação ou de oferecer queixa ou prosseguir com a ação.” (NR)
Art. 9º Revogam-se o inciso VI do § 2º e os §§ 2º-A e 7º, todos do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).
Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 9 de outubro de 2024; 203º da Independência e 136º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Macaé Maria Evaristo dos Santos
Manoel Carlos de Almeida Neto
Aparecida Gonçalves
Simone Nassar Tebet
Este texto não substitui o publicado no DOU de 10.10.2024